O Lean na redução do Lost Time

Nas empresas, a implementação do Lean tem como principal objectivo a análise dos processos existentes para identificar e eliminar os desperdícios que estejam de alguma forma a condicionar a sua eficiência e a contribuir para incrementar os custos. Muitas vezes julga-se que este tipo de implementações são complexas, mas desde que existam os recursos necessários, motivação e seguindo algumas metodologias simples, atingem-se os objectivos pretendidos com alguma facilidade. 

Antes de iniciar um processo de melhoria, deve-se definir o que se pretende fazer e garantir, com a gestão de topo, que existem os recursos necessários para o conseguir, de modo a que após o seu arranque este não pára por falta de meios (humanos ou técnicos). Caso isso aconteça, o projecto cai em descrédito, a desmotivação aumenta e facilmente o objectivo fica por atingir.

Como nos processos produtivos, também na manutenção industrial a implementação das metodologias Lean na sua actividade diária têm um enorme impacto na redução do desperdício e maximização do valor acrescentado. Neste artigo vamos seguir passo a passo um caso de  redução do tempo morto numa linha de produção, seguindo a implementação de um projecto de melhoria contínua.

1) Definir o que é mais importante e o que se pretende melhorar

Na empresa X, a secção mais crítica é a embalagem, constituída por 10 linhas de produção, onde as falhas técnicas condicionam toda produção, provocando atrasos nas entregas aos clientes, custos elevados para a empresa e consequências na sua reputação. Existe um enorme stress nesta secção, a pressão sobre a manutenção é muito elevada. Não existiam dados concretos sobre as causas raiz dos problemas, o que provocava alguma confusão e com facilidade se atribuíam as responsabilidades aos equipamentos. 
O gestor da manutenção, em conjunto com os colegas da melhoria contínua e produção, pretendem melhorar esta situação pelo que definem um plano. Começam por eleger uma área para começar a implementar o seu processo de melhoria da eficiência e redução do número de paragens. Escolhem apenas uma linha (linha 1) para iniciar o processo, por forma a obterem resultados rápidos, o que permite ajustar os desvios, introduzir as correcções e posteriormente expandir para as restantes linhas.

2) Apresentar o projecto, organizar os recursos e formar

Após a definição do projecto, este é apresentado à gestão de topo, com a apresentação do objectivo, do processo de implementação e dos recursos necessários para o seu sucesso. Neste caso a administração acreditou no projecto e proporcionou as condições necessárias para o mesmo avançar e atingir os resultados pretendidos. Posteriormente o projecto foi apresentado à equipa e aos colegas dos restantes departamentos, pois na sua implementação todos têm de estar envolvidos e participar activamente. Posteriormente foi dada  formação necessária para a implementação.


3) Medir e mapear a situação actual em detalhe

Esta fase inicia-se por fazer um levantamento de todos os equipamentos existentes na linha, identificar todos os problemas técnicos e corrigi-los. Posteriormente define-se a forma de medir todas as paragens da linha com a identificação do equipamento, a causa e soluções para o problema. O ideal seria ter um sistema automático de medição e tratamento de dados, mas como esta implementação tem um custo significativo e a sua implementação é morosa, opta-se por implementar um sistema manual. Implementa-se um sistema simples que consiste em entregar um cronómetro ao líder da linha para medir ao segundo os tempos de paragem e implementa-se um checklist onde é registado o tempo de paragem, o equipamento, a origem do problema e a sua resolução. Com esta implementação começamos a ter uma percepção real do tempo morto e dos equipamentos mais críticos.

4) Definir um objectivo e dar-lhe visibilidade

Após o inicio da recolha de informação, começam a surgir dados concretos sobre os tempos de paragem e as suas causas. Com estes dados é possível definir indicadores (SMART) de acompanhamento. Após a sua definição, faz-se um seguimento gráfico da evolução dos resultados, que deve ser exposta e acompanhada por todos. Esta processo motiva a equipa a fazer mais e melhor para obter uma evolução positiva dos resultados.

5) Identificar os desvios numa fase inicial

A recolha de dados de paragens ao segundo permite, para além da identificação da origem das paragens, identificar as micro paragens que ocorrem, as quais normalmente os operadores repõem em normal funcionamento sem chamar a manutenção. Esta detecção precoce dos problemas permite à equipa da manutenção a sua identificação e eliminação, evitando assim possíveis paragens que iriam ocorrer e provocar tempos mortos alargados.


6) Identificar a causa raiz

Os dados recolhidos são analisados diariamente pela equipa em reuniões de 10 minutos. Procura-se identificar a causa raiz dos problemas, utilizando a metodologia dos 5 porquês com um espírito de pro-resolução. Quando pela sua complexidade não é possível chegar à origem dos problemas, promovem-se reuniões de análise alargada onde se procura a sua resolução com a utilização de outras ferramentas de análise de falhas. Define-se sempre um plano de acção para a sua resolução.

7) Fazer uma alteração de cada vez

Na análise diária dos problemas propõe-se uma resolução imediata, ou assim que possível, para todas as anomalias que têm uma origem identificada e uma resolução simples. Para os problemas mais complexos e após análise mais aprofundada da possível origem, implementa-se um plano que normalmente tem diversas acções para eliminar os problemas. Se todas forem implementadas em simultâneo, não será possível quantificar o impacto de cada uma pelo que, para evitar esta situação, deve implementar-se uma acção de cada vez, analisando o seu impacto na resolução.

8) Seguir, aprender e standerizar

Todas as anomalias que são solucionadas são partilhadas pela equipa por forma a haver uma aprendizagem e crescimento global de todos os técnicos. Com uma definição correcta da causa raiz e da resolução do problema, em conjunto, analisam-se as formas do mesmo não voltar a surgir, propondo-se soluções como por exemplo: alterações técnicas; colocação de novas acções nas inspecções; melhorar o plano de manutenção preventiva, etc.
O principal objectivo é o problema não voltar a surgir.

9) Repetir

A repetição diária da metodologia na linha 1, permite melhorar a eficiência e qualidade de forma sustentada, com resultados concretos e objectivos.  Com o sucesso comprovado deste projecto  e seu reconhecimento por todos, a sua expansão e repetição para as restantes linhas é facilitada e necessita de muito menos esforço para a sua implementação.


10) Ser Lean é procurar a melhoria e o sucesso

A disponibilidade dos equipamentos aumentou e a satisfação dos clientes também, pelo que se pode considerar que o esforço exercido por todos nesta implementação foi compensatória. Mas ser Lean é a procura constante pela melhoria e ter como objectivo o sucesso. Sendo assim todos devem continuar, após a standerização das boas práticas alcançadas, a rever os processos para fazer mais e melhor todos os dias.


Nos últimos anos, a indústria tem melhorado a sua eficiência de forma sustentada, com a implementação das metodologias e ferramentas Lean nos processos produtivos. A manutenção tem sido um pouco esquecida nestas implementações, embora na minha opinião uma aposta concreta e objectiva destas metodologias na manutenção pode trazer enormes benefícios para a empresa, eliminando desperdícios e acrescentando valor à sua actividade diária. Neste exemplo comprova-se que a implementação deste processo de melhoria contínua incrementa significativamente os resultados da manutenção, e a empresa produz mais e melhor todos os dias.

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